A novela Ronaldinho mostra que o futebol brasileiro está pulando para outra ordem de grandeza
Enquanto escrevo, nada de final para a insuportável novela Ronaldinho. Durante o dia, ouvi especulações que (pelo menos ainda) não sairam na imprensa e que são de arrepiar. Enfim: pode ser que acabe hoje, pode ser que ainda dure mais um tempo, vai saber? O cara tá fazendo de tudo pra adiar ao máximo sua volta aos treinos.
Mas estive conversando com amigos sobre todas essas especulações e números que temos ouvido e pensando um pouco sobre o que está acontecendo com o futebol brasileiro. Me lembro que, há não tanto tempo assim, um milhão por mês pagava a folha de pagamento inteira do Flamengo. Posso estar enganado, mas tenho a impressão de que a ordem de grandeza era mais ou menos essa no ano em que perdemos a Copa do Brasil para o Santo André (a referência é porque tenho a lembrança de algumas comparações entre as folhas de pagamento de um time e de outro - mas a memória pode estar me traindo).
Hoje, ao que parece, um milhão não dá pra pagar o salário de um só jogador. É um jogador muitíssimo valorizado, claro. Mas fato é que quatro clubes brasileiros apareceram dizendo ter como levantar esta grana - e mais ainda - para ter Ronaldinho Gaúcho em seu elenco. Alguns vão dizer que é um ponto fora da curva, mas, sem falar nas badaladas voltas de Adriano, Ronaldo e Robinho, vemos também Fred e Deco ganhando coisa de 700 mil por mês no Fluminense, o próprio Flamengo falando em pagar isso aí a Thiago Neves e por aí vai. Os exemplos vão se multiplicando, com cifras cada vez mais altas.
Isso se sustenta? O pior é que eu tendo a achar que sim - claro, se trabalharem direito. Até porque boa parte destes salários são, em grande parte, pagos por "parceiros"; e estes parceiros, ao contrário dos clubes, são empresas e empresários que visam o lucro. Se estão colocando seu dinheiro ali, é porque retorno deve haver. Ao menos em boa parte dos casos.
E aí coloco a pergunta: quando será que os próprios clubes - Flamengo incluído - vão ser organizados e profissionais para eles mesmos usufruirem da maior parte deste retorno, em vez de terceirizar fatias tão grandes dele? Na Espanha, por exemplo, o Real Madrid coloca no contrato de seus jogadores que todo contrato publicitário que assinarem, uma fatia irá para o clube, que valoriza os seus jogadores por tê-los em seu elenco; aqui, ao contrário, os clubes estão prometendo fatias generosas de seus próprios patrocínios aos seus maiores jogadores. É uma distorção que, espero, um dia irá acabar.
Até porque, por mais que haja gente brigando contra por todo canto, o processo de profissionalização da gestão do futebol brasileiro está caminhando. Além da força da concorrência (no que um clube começa a dar seus passos, outros acabam se vendo forçados a fazer alguma coisa, mesmo que timidamente), forças externas agem para isso; empresas percebem cada vez mais que o negócio é bom, colocam cada vez mais dinheiro e, por isso, prestam atenção cada vez mais de perto no que é feito com ele. O próprio marketing do Flamengo, que ainda tem muito mesmo a caminhar, deu um belo salto a partir da entrada da Olympikus na vida do clube. Outras receitas ainda estão bem abaixo, o modelo é bem diferente (eu sei de tudo isso!), mas hoje um Corinthians ou Flamengo consegue arrecadar com patrocínio de camisa mais ou menos o mesmo que o Milan, algo que parecia inimaginável há não tanto tempo assim.
E a minha outra curiosidade: qual será o primeiro grande clube brasileiro a fazer uma oferta a sério por um Ibrahimovic ou um Robben da vida? Com a quantia que estão conseguindo levantar para o decadente Ronaldinho, daqui a pouco alguém vai se dar conta de que é possível ter este tipo de ideia - e, com a Europa com economia estagnada e clubes cujas contas não fecham, a chance pode se tornar real.
Já imaginaram ver por aqui o ataque Eto´o e Obina em ação?
ANDRÉ MONNERAT trabalha com marketing e Internet e escreve no SobreFlamengo (www.sobreflamengo.com.br e twitter.com/sobreflamengo)
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