A Ética das Formigas
Evidentemente que nesse sábado eu preferia estar como nosso time. Vestido de vermelho e preto e em concentração total para a nossa estréia no Carioca 2009. O Flamengo vai voltar e isso é o que importa. Mas a marcha dos acontecimentos e uma porrada de emails furibundos mais uma vez me atropela e serei obrigado a falar da popularíssima ginástica artística. Então vamos a isso sem mais delongas.
Incoerência, aqui me tens de regresso. E suplicante lhe peço a minha nova inscrição. Eu sei que vivo dizendo por aí que o Flamengo é o maior do mundo porque, entre nossas outras inúmeras vantagens comparativas, o Flamengo é muito mais que o futebol. Afora a nossa mítica gênese náutica o nome do Flamengo se gravou com letras douradas no livro maior do desporto nacional nas mais escalafobéticas modalidades. Vocês provavelmente já o sabem, mas permitam-me repetir apenas como lembrete aos mais avoados: Nos primeiros 113 anos de sua existência gloriosa o Mengão já foi referencia nacional em esportes tais como hipismo, arco-e-flexa, tiro ao alvo e luta greco-romana.
A esses esportes que hoje são apenas desbotadas reminiscências flamengas se junta agora a ginástica. Será que vale a pena chorar por ela? Além da glória, da confirmação da nossa já reconhecida superioridade e da imorredoura inveja da arco-íris, o que os nossos lauréis conquistados nas pistas, piscinas e tatames nos trouxeram?
Nas contas desapaixonadas de um inútil balancete olímpico o que devemos lançar na coluna dos saldos? Quantos torcedores a bocha arregimentou pras nossas hostes? Quantas cervejas os adversários nos pagaram em virtude de um mortal carpado? Quantos vascaínos você sacaneou depois da ultima final estadual de ping-pong? O que quero demonstrar é que para a medição de certas grandezas a matemática não no serve para nada.
Mas, infelizmente, a matemática continuará sendo a nossa principal aliada na longa, dolorosa e desglamurizada jornada que o Flamengo empreende rumo ao seu lugar de direito. Será que alguém ainda discute a necessidade de reinvenção do Flamengo? Não é ponto pacifico de que do jeito que está não dá mais? Não ficou cabalmente demonstrado que não se pode gastar mais do que se arrecada? Já não é a hora do futebol do Flamengo parar de carregar nas costas o ônus de pagar pelas nossas fugazes alegrias olímpicas?
Ignoro totalmente os meandros da administração dos esportes olímpicos flamengos. O que sei é que temos na vice-presidência olímpica uma dirigente amadora que é obrigada por lei a dar expediente na Câmara de Vereadores. Cada esporte deve ter seu diretor (não conheço a nenhum) que por sua vez devem ter seus compromissos pessoais. É com o tempo que lhes sobra desses compromissos que podem exercer suas funções executivas. Agora me digam se é possível ao Flamengo ou a qualquer outra agremiação terráquea ser uma referencia esportiva trabalhando dessa maneira amadora? Aliás, não precisam me dizer nada porque eu já sei que a resposta será NÃO.
Mesmo considerando Danielle, Diego, Jade, Georgette Vidor e Luisa Parente exemplos eloqüentes de rubro-negros de valor me permito um breve momento de mesquinharia. Em que pese toda a abnegação guerreira desses atletas, sua dedicação e os hectolitros de suor derramados não me lembro de nenhum deles a sacudir o nosso pavilhão nos pódios do mundo. Aliás, do que me lembro bem é do Diego desfilando suas medalhas de oiro em um carro de bombeiros em Curitiba sem qualquer adereço ou referencia ao nosso titânico Flamengão.
Muito se tem malhado o Flamengo e seus inortodoxos métodos de resolução de pendências com seus parceiros. Malhei também no caso da Nike, da Olimpikus e da Petrobras, mas agora que Marcio Braga abriu a caixa de ferramentas para detonar a sesmaria do COB e suas malfeitorias eu não malho não. Porque dessa vez o Mengão ta certo.
Com a dotação milionária com que o COB e seus perdulários engravatados arrancam dos nossos bolsos na base da canetada não há razão alguma para que eu e minhas garotas, que só usamos a piscina, continuemos pagando para que a Jade e o Diego mostrem ao mundo que não somos uma nação de aborígenes que só sabe correr atrás de uma bola. Quem tem que bancar o desenvolvimento do esporte nacional é o governo, a iniciativa privada ou a mão invisível do caboclo Adam Smith e não os já vilipendiados sócios do Flamengo.
Como já dizia o escocês " Não é da bondade do homem do talho, do cervejeiro ou do padeiro que podemos esperar o nosso jantar, mas da consideração em que eles têm o seu próprio interesse. Apelamos, não para a sua humanidade, mas para o seu egoísmo, e nunca lhes falamos das nossas necessidades, mas das suas vantagens."
Se o Flamengo quer mesmo se profissionalizar, se é isso mesmo que a torcida deseja, é bom que nos acostumemos a cortar na carne. Que nos habituemos a ser morigerados, econômicos e previdentes. Para que os tempos de cigarra acabem é preciso que a ética das formigas prevaleça. E acostumem-se logo à lógica dos pontos corridos, a vida das formigas sempre foi muito chata.
Mengão Sempre
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