terça-feira, 23 de novembro de 2010

Alfarrábios do Melo

“Torcida de time grande não comemora permanência na elite” (Muhlenberg, Arthur)

Olá, saudações flamengas a todos.

Enfim, o Flamengo voltou a vencer e a interagir com a Nação. O espetáculo foi até bonito, o time demonstrou espírito de luta (e na verdade, não mais do que isso), e a vitória suada, e até certo ponto dramática, contra o inexpressivo Guarani (como um negócio daqueles pode estar na Série A?), deve ser o suficiente para afastar os pesadelos mais sombrios. Se bem que, vendo coisas como Prudente e Guarani desfilarem no relvado, sigo achando que o Flamengo precisa fazer um esforço hercúleo para brigar em Z-4. Aliás, lembro que ainda temos SETE equipes atrás de nós, das quais duas já embarcaram e uma (Guarani) já comprou a passagem pra casa do c..., ahn, para a segundona. A briga entre Vitória e Atlético-GO pela última vaga vai ser bonita.

Sobre o jogo, apenas uma coisa me chamou a atenção. Acabou o amor, a paciência, a confiança da torcida no Marcelo Lomba. Aquele massacre de vaias, aquele linchamento com 40 mil dedos apontando “foi ele, apedrejem!” costuma soterrar carreiras, e dessa experiência poucos emergem mais fortes. Espero que seja o caso do Lomba, goleiro tecnicamente bom (ótimos reflexos, razoável senso de antecipação), com alguns defeitos sérios (saída do gol em bolas alçadas, orientação e posicionamento da defesa) cuja reincidência parece ter-lhe minado completamente a confiança (solta e rebate o que aparece na frente, sintoma de goleiro nervoso).

Aí alguns poderão dizer: “então tira”. E põe quem? O Vinícius, o Paulo Victor? Tudo garoto, sujeito ao mesmo tipo de pressão. Pra mim, a falha foi a ausência de um goleiro mais rodado, mesmo que para a reserva. A presença de um elemento desses no elenco é importante para acalmar e alavancar a carreira de garotos promissores. O Cantarele e o Clemer, que ajudaram muito o início das carreiras do Zé Carlos e do Júlio César, respectivamente, são exemplos disso.

O Flamengo já viveu uma situação parecida. Foi em 1995, passagem que relembro agora, rapidamente.

Seguinte: o Kleber Leite acaba de trazer o Luxemburgo e o Romário, há aquela onda, aquela euforia pelo Centenário. Também chegam Branco, Mazinho (ex-Bragantino e Bayern Munique), William, Válber, Jorge Luiz, entre outros. Mas, para o gol, decide-se apostar no jovem Adriano, que enfim assumirá a posição após a aposentadoria de Gilmar Rinaldi. Adriano, titular do time Campeão da Copa SP em 1990, costuma entrar no time e suas atuações são elogiadas. Goleiro de boa altura, muito elástico, é apontado como uma boa alternativa para o setor. Para a reserva de Adriano, é contratado o goleiro Emerson, outro jovem que vem agradando no Grêmio.

Começa a temporada, só se fala em Romário, Romário, e a equipe vai atuando meio aos trancos, algo normal em início de ano. Mas Adriano começa a dar vívidos sinais de que não está preparado para a intensidade dos holofotes que recaem sobre o time. Falha sucessivamente, mostra insegurança, especialmente nas saídas do gol. Como os adversários são frágeis e o Flamengo vai vencendo, isso é relevado. No entanto, em uma tarde ensolarada na Gávea, o rubro-negro escapa por pouco da derrota, ao empatar em 3-3 com o Volta Redonda, com um gol de Romário no final. Adriano falha de forma grotesca em pelo menos dois gols. Treinador e torcida perdem a paciência, e o garoto é barrado.

Na partida seguinte, Emerson é efetivado. Não é muito exigido contra o Madureira (2-0), e contra o Friburguense aparece com boas intervenções, dando a impressão de que tomaria conta da vaga. O time vai vencendo (3-0), mas quando nada mais se espera da partida, eis que uma bola é chutada de longe, mansinha, rasteira, dócil. Um garoto de dez anos teria posto mais força no arremate. Emerson se agacha, confiante. Dali a instantes, estará caído, atônito, com a Gávea em silêncio, em um dos frangos mais sensacionais da era moderna do futebol (parecido com o do goleiro inglês nessa última Copa). O Flamengo vence (3-1), mas o estádio esvazia-se calado, preocupado. Não, o time ainda não achou seu goleiro.

Emerson seguirá na equipe por algum tempo, sem jamais convencer. O frango devasta-lhe o moral, as mesmas falhas de Adriano são repetidas, as mesmas saídas vacilantes, as mesmas bolas bobas espalmadas. Já no Octogonal Final, Emerson atua muito mal na derrota contra o Botafogo (0-1), e terá o mesmo destino de Adriano: o banco.

Sem alternativas, Luxemburgo promove às pressas o terceiro goleiro, que vinha sendo preparado com cuidado e carinho para estourar no ano seguinte. Roger Noronha, titular das seleções de base, goleiro com porte fenomenal, padrão europeu, dotado de um reflexo desumano, considerado um jogador para décadas no Flamengo. No ano anterior, havia sido emprestado ao Vitória para amadurecer e virou ídolo na Bahia, com defesas espetaculares. Mas no Flamengo a coisa é diferente. E o time está em plena fase final de campeonato.

Não dá outra. Roger falha em sua primeira apresentação (ironicamente, novo 3-3 com o Volta Redonda), comete erros na derrota (3-4) do Fla-Flu, mas aos poucos mostra ser tecnicamente bem superior aos colegas. No entanto, muito irregular, conjuga atuações absurdas, como na vitória (1-0) sobre o Botafogo, em que fez defesas antológicas, com momentos bizarros. O Flamengo termina o primeiro semestre sem conseguir resolver a carência na posição.

No segundo semestre, Roger volta à reserva com a contratação de Paulo César, que no início agrada, mas justamente nos momentos decisivos aparece com falhas medonhas. Roger retorna ao time em 1996, e finalmente consegue assumir a posição. Mas a seu lado está o veterano Zé Carlos, que o ajuda com conselhos e dicas preciosas.


Enfim, na minha opinião o Marcelo Lomba deve, sim, ser mantido para os jogos finais. Em 2011, sua condição de titular deve ser repensada. Mas, titular ou reserva, defendo que seja trazido um goleiro experiente para ajudar na sua formação. Um arqueiro capaz de assumir a posição a qualquer momento, caso o Lomba siga demonstrando falta de preparo mental para seguir no gol. Um goleiro que nem precisa ser uma sumidade, um nome de seleção. Mas é necessário que seja alguém tranqüilo, seguro e com experiência em grandes equipes.

Sabe-se que o elenco vai mudar, ser reformulado. Espera-se que o Luxemburgo, ironicamente o mesmo comandante de 1995, dessa vez não se esqueça da importância de se contar com um goleiro experiente no elenco.

Não é muito agradável cometer o mesmo erro duas vezes.

Flamengo Net

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