terça-feira, 1 de junho de 2010

Alfarrábios do Melo

Olá, saudações rubro-negras a todos.

ZICO. Muito já se falou, muito já se escreveu sobre essa espetacular aquisição do Flamengo. E, antes de iniciar o tema do post, quero lembrar uma passagem rápida, não sobre o Zico craque, gênio, deus da bola. Mas sobre o Zico LÍDER.

1980, final do Brasileiro. Mesmo parcialmente recuperado de contusão, Zico vai pro jogo, vai pro pau. Logo no início, leva um pontapé do volante brucutu Chicão, daqueles pra intimidar. E Chicão sabe bem o que é isso, pois havia quebrado meio time adversário na final de 1977 (jogava pelo São Paulo). Muitos o temem. Não Zico, o jovem que debuta em sua primeira final. E não afina, não treme. “Filho da p..., outra dessa e te tiro do jogo, seu merda!”. Claro que não tirou, Zico não era disso. Mas Chicão também não bateu mais. O jogo passa, Zico é decisivo, com um gol e uma assistência. Mas no segundo tempo Reinaldo empata, ensaia silenciar o Maracanã. Zico pede a bola, “dá essa merda aqui, quero no meu pé, quem manda nessa porra sou eu, vamos pra cabeça e é agora! Acabou a palhaçada!” Valente e agressivo, o Flamengo vence o jogo e conquista o Brasil.

Que Deus ilumine o Galinho!

* * *
Essa semana, dando continuidade à Série sobre os jogadores do Flamengo em Copas (Parte 1 aqui), lembro o Mundial de 1938. Boa leitura.

1938 – Com Domingos e Leônidas, finalmente protagonistas

1938. Enfim, um mínimo de organização. Sem as brigas que o impediram de enviar seus melhores jogadores em 1930 e 1934, o Brasil surgia com uma Seleção forte para a disputa do Mundial da França. O treinador Ademar Pimenta chegava ao requinte de treinar duas formações separadas. O time “branco”, mais técnico, com um futebol refinado, e o time “azul”, de futebol mais vigoroso, dado a choques.

O Flamengo vive um processo de renascimento, após o pior período de sua história. O presidente Bastos Padilha dá início a uma gestão revolucionária, voltada para a montagem de um grande time de futebol. Percebe que o futuro da instituição está no fortalecimento de seu perfil popular. Abandona de vez o ranço elitista que ainda impregnava o futebol e investe pesado em jogadores pobres, negros, suburbanos e bons de bola. Nesse contexto, virão nomes como Fausto (craque brasileiro da Copa de 1930), Sá, Jarbas, Walter, Domingos e Leônidas. Além disso, Padilha consegue construir o Estádio da Gávea, que será inaugurado após o Mundial. Como resultado, as participações do time no Carioca melhoram, o Flamengo chega muito perto do título, bate na trave. Mas todos sabem que o fim do jejum (que vem desde 1927) é questão de tempo. Enquanto isso, o clube cede três jogadores para a Copa, o goleiro Walter (grande destaque da temporada), o zagueiro Domingos e o atacante Leônidas.
Sobre Domingos e Leônidas, muito já foi falado neste post aqui.

Domingos, zagueiro extremamente clássico que marcou época (capaz de sair driblando, passar e lançar com perfeição), chegou ao Flamengo em 1936, emprestado pelo Boca Jrs. Bastaram seis meses, apaixonou-se, “picado pelo extraordinário micróbio que vive no Flamengo”, segundo ele mesmo. Voltou ao Boca, forçou a barra pra sair, ignorou uma proposta milionária do futebol francês. “Quero ir pro Flamengo, fazer um contrato longo”. Ficaria oito anos.

Leônidas também chegou em 1936, vindo do Botafogo a preço de banana (foi fundamental no título com asterisco de 1935, mas aprontou tanto que acabou praticamente enxotado de lá). Mordido, jurou tornar-se o melhor do Brasil no Flamengo. E cumpriria a promessa...

O Brasil estreia na Copa contra a valente Polônia, que exerce resistência inesperada e após empate em 4-4 força a prorrogação. No tempo extra, Leônidas marca um gol polêmico, depois que sua chuteira se rompe e, enquanto se providenciava uma reserva, aproveita um rebote e empurra a bola pro gol, mesmo descalço. O campo enlameado e as meias pretas do Brasil (uniforme da época) atrapalham a visão do árbitro, e o gol é validado. O Brasil vence (6-5) e Leônidas é destaque, com três gols.

A seguir, a Seleção enfrenta a forte Tchecoslováquia (então vice mundial), em Bordeaux. Walter ganha a posição do criticado goleiro Batatais (Fluminense), e os três jogadores flamengos são titulares do time. Mas pouco futebol se assistiria. O jogo descamba para uma batalha selvagem, em que dois tchecos, o goleiro Planicka (fratura no braço) e o atacante Nejedly (perna quebrada), contundem-se seriamente. A batalha termina 1-1, numa grande atuação de Domingos. O gol brasileiro é (novamente) de Leônidas.

No desempate (não havia decisão por pênaltis, mas partida-extra), o Brasil perde OITO jogadores. Dos remanescentes do primeiro jogo, somente Walter e o corintiano Lopes reúnem plenas condições de jogo. Leônidas está lesionado, mas vai pro sacrifício. E é decisivo, marcando um dos gols da vitória brasileira por 2-1, de virada, em outro jogo violento. A Seleção chega às Semifinais. Leônidas já é considerado o craque da Copa, apelidado de “Homem-Borracha” pelos maravilhados franceses.

Vem o difícil jogo contra a campeã Itália. Leônidas sente o esforço da partida contra os tchecos e está fora. Seu reserva Niginho não tem condições legais de jogo (rompeu unilateralmente contrato com a Lazio, foi convocado assim mesmo, e após o protesto dos italianos, não pode ser utilizado). O jeito é improvisar o atacante Romeu, o que não dá certo. A Itália domina e abre 2-0. Domingos, que vinha sendo o melhor em campo, acaba vítima do destempero, ao agredir sem bola o atacante Piola dentro da área, gerando o pênalti que redundaria no segundo gol italiano. Já no finalzinho, Romeu marcaria o gol de honra, fechando em 1-2 a derrota.

Aí começa a polêmica. Com a língua solta que sempre o destacou, Leônidas, numa entrevista, critica duramente a atuação do time. “Faltou raça ali, a equipe foi mal escalada, o ataque esteve um caos, só a defesa se salvou, principalmente Domingos.” Com isso, o ambiente se torna pesado para o “Homem-Borracha”. E sua grande atuação na decisão do 3º Lugar contra os suecos, com dois gols na vitória por 4-2, faz surgirem rumores de “corpo-mole”, “mala preta”, para não atuar contra os italianos. Com tanta facilidade para arrumar desafetos, não era difícil aparecer esse tipo de intriga contra Leônidas.

Por fim, o Brasil termina num belo terceiro lugar (a Itália repete o título), e Leônidas (artilheiro da Copa, com sete gols) e Domingos voltam com o prestígio nas alturas. Domingos é perdoado pelo lance do pênalti (atribuído ao “juiz ladrão” pela crônica) e Leônidas vira marca de chocolate e se torna uma celebridade tão popular quanto Getúlio Vargas, o cantor Orlando Silva e Carmen Miranda. O goleiro Walter, não tão badalado, firma-se de vez no gol do Flamengo, onde atuará até 1941.

Por sinal, o Flamengo segue montando um dos melhores times de sua história. Perde o campeonato de 1938 por pouco, mas em 1939 finalmente manda o jejum pro espaço, numa final apoteótica em que enfia 4-0 no Vasco. Mais do que o fim do jejum, está aberto o caminho para o início de uma verdadeira hegemonia.

O primeiro tri se aproxima.

Flamengo Net

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