Por Vinicius Paiva
Eu nem preciso dizer que tô com ódio, rancor, tristeza, vergonha e todas os famigerados sentimentos que neste momento acometem 35 milhões de corações. Devo ainda confessar que a lamentável seqüência de revezes, que ainda nem havia se concretizado na semana passada, já gerava em mim terríveis ondas da mais absoluta falta de inspiração. Andei sumido, mas cá estou eu, de volta ao trabalho. Façamos, entre mortos e feridos, uma breve análise de uma maldição que vem atormentando o Flamengo nos últimos anos, e que destroça todo e qualquer planejamento que se possa fazer, especialmente sob a ótica dos negócios.
Imaginem um hipotético time que tenha se sagrado campeão estadual, ou que faça excelente campanha na Libertadores, ou que lidere o campeonato nacional ou tudo isto junto. Este time, naturalmente, levará sua torcida ao êxtase, e isso gera um momento absurdamente propício a todo tipo de iniciativa de marketing: venda de camisas, ingressos, títulos de sócio-torcedor, etc. Caso, durante estas seqüências vitoriosas, o time tome uma piaba, uma goleada ou um sacode qualquer, o impacto deste acontecimento nas finanças do time podem ser irrisórios ou catastróficos. Tudo depende do quão comprometida fique a campanha a partir de então.
É necessário que eu diga que há três temporadas, é o cenário mais nebuloso aquele que impacta sobre o Clube de Regatas do Flamengo?
Desde 2007, o Flamengo começou a fazer uma vergonha atrás da outra, e isto já foi explorado em verso e prosa pela mídia esportiva. A questão que pretendo me ater é sobre o quão inapropriados são os momentos em que as vergonhas tem acontecido nestes últimos três anos. Nossos sucessivos vexames SEMPRE OCORREM MINUTOS DEPOIS dos momentos de euforia máxima da temporada. Não há sequer tempo se de colher os louros da boa safra. Trata-se de uma verdadeira maldição do orgasmo precoce.
06/05/2007. Após uma eletrizante decisão do Campeonato Carioca contra um Botafogo até então bastante superior, o Flamengo mostra sua força. Renato Augusto acerta um petardo do meio da rua, empata a partida em 2x2 a pouco tempo fim da partida e a leva para a decisão nas penalidades máximas, que seriam vencidas por nós. Euforia, que só não seria maior porque 4 dias antes, depois de uma atuação abaixo da crítica e uma confusão no vestiário, o Flamengo havia sido demolido pelo Defensor, no Uruguai, por 3 x 0, pelas oitavas-de-final da Libertadores. Em 09/05/2007, o Flamengo não conseguiu reverter o placar no jogo de volta, no Maracanã. Venceu por apenas 2 x 0 e, apesar de sair de campo sob aplausos, esfriou grande parte de sua torcida, esperançosa por uma grande campanha no torneio. Nossos produtos, que deveriam vender como água no deserto, vivem então uma situação de relativo encalhe. Tudo porque, três dias após um título estadual que não conseguíamos desde 2004, o Flamengo foi eliminado. E essa eliminação, fruto de um 3 x 0 que se tornaria o primeiro de muitos. Como desgraça pouca é bobagem, no domingo seguinte o Flamengo estreou no Campeonato Brasileiro fazendo outro vexame e tomando de 4 x 2 do Palmeiras. De novo jogando em casa.
O ano de 2007 ainda teria uma particularidade bastante prejudicial às vendas de produtos oficiais do Flamengo. Ao final desta mesma temporada, após uma reação fabulosa que levou o time da 19ª à 3ª colocação no Campeonato Brasileiro, simplesmente não haviam camisas do Flamengo nas lojas. Um desabastecimento irresponsável fez com que a Nike não suprisse a fortíssima demanda por produtos da nossa torcida. Não se encontrava uma só camisa, e o resultado foi que, naquele ano, o Flamengo vendeu tantas camisas oficiais quanto o Vasco, o que configurara um fiasco em termos de marketing. Desde então, Flamengo e Nike entraram em litígio.
04/05/2008. Agora sim não havia mais desculpa. O Flamengo se sagra bicampeão estadual com extrema facilidade, após um 3 x 1 sobre o Botafogo. Para melhorar, o time, que vinha com a segunda melhor campanha da primeira fase da Libertadores (tal qual em 2007), havia atropelado o América do México por 4 x 2 no jogo de ida das oitavas-de-final, jogando no estádio Azteca. Num momento de nirvana, torcida e diretoria prestam homenagens a Joel Santana, que se despediria do clube três dias depois, após a partida do Maracanã. O que ninguém esperava era o acontecimento do Cabañazzo que calou o maior estádio do mundo. Numa das maiores calamidades da história do Flamengo, o América do México nos sapeca um 3 x 0, revertendo a vantagem e pulverizando nossa euforia.
Após um começo de Brasileirão promissor, quando liderou o certame por pouco mais de 10 rodadas, o Flamengo novamente freia toda e qualquer possibilidade de aumento de venda de produtos ao ficar mais de um mês sem vitórias, e saindo das primeiras posições. O time ainda retomou as rédeas, lutou pelo título do Brasileirão até a antepenúltima rodada, e pela vaga na Libertadores até a última. Mas derrotas pornográficas para os Atléticos Mineiro (0 x 3 no Maracanã) e Paranaense (3 x 5 em Curitiba), bem como empates ridículos contra Portuguesa (2 x 2) e Goiás (3 x 3) em pleno Maracanã (este último, após vitória parcial de 3 x 0) nos tiraram a sonhada vaga na Libertadores-2009. A ilusão termina. E a torcida, como sempre, desanima com o time.
Mas aí veio 2009. E um ano que começou no desânimo dos acontecimentos acima relatados passou a se mostrar animador. O Flamengo foi pentatricampeão estadual, assumindo de forma definitiva a hegemonia no estado do Rio de Janeiro, com 31 títulos. Na Copa do Brasil, fazíamos excelente campanha e éramos considerados favoritos, mesmo com um chaveamento desfavorável que nos cruzava com o Internacional-queridinho-da-mídia. Pra completar a festa, um grande ídolo, Adriano, retornou ao Flamengo, e estreou com casa cheia, fazendo gol e levando a Nação a momentos de magia.
Fora de campo o Flamengo renegociou dívidas, desbloqueou cotas, rompeu antigas e desfavoráveis parcerias, assinou com uma excelente fornecedora de material esportivo (e por valores recorde) e negociou com algumas das maiores empresas do Brasil e do mundo, de modo a tentar catapultar os valores recebidos a título de patrocínio. Os seis meses jogando sem receber um tostão pareciam “ossos do ofício”, “mal necessário”. Após um ano e meio de litígio com a Nike, finalmente vestiríamos, a partir de 1º de julho, nosso novo traje da Olympikus. A torcida, eufórica e ávida por “consumir Flamengo”, pressionava por um projeto de sócio-torcedor que nos fizesse ultrapassar com facilidade a casa dos 100 mil associados.
Tava tudo lindo. Lindo demais pra ser verdade.
Apenas 20 dias após o título estadual, o Flamengo caiu para o Internacional na Copa do Brasil. Com hombridade, mas com falhas clamorosas dos supostos “doninhos do time” Juan e Bruno. Duas semanas depois, após a estréia de Adriano e com o time ocupando uma honrosa quinta colocação no Brasileirão, começou a mais estapafúrdia seqüência de vergonhas que já se teve notícia. O Flamengo, após fazer 2 x 0, permite a reação do Sport e toma QUATRO GOLS EM OITO MINUTOS. Bruno, como começou a virar hábito, falha nos momentos mais importantes. Juan e Leonardo Moura se omitem. E na rodada seguinte, (mundialmente conhecida como domingo passado), o Flamengo leva uma trauletada de 5 x 0 do Coritiba, com mais três falhas de Bruno, e outras tantas da pavorosa zaga.
O ano nem bem chegou à sua metade, e cabeças já começaram a rolar. Mas as cabeças que queremos ver são as que continuam intactas. São os “fodinhas da Gávea”. São os integrantes dessa diretoria incompetente, que entra ano, sai ano, permitem que passemos por situações que clube algum no mundo passa. Ao menos um clube da magnitude do Flamengo.
E esta temporada, que começou tão desanimada, mas que esboçou uma luz no fm do túnel, tornou a desenhar os contornos do sofrimento que está por vir.
Ah, o nosso marketing? Mais uma vez sofre as conseqüências da síndrome detalhadamente descrita nos parágrafos anteriores.
Ou tem alguém transbordando felicidade pela possibilidade de adquirir nossas novas camisas, que estão a menos de duas semanas do lançamento? (*)
Ou tem alguém aí que hoje se tornaria sócio-torcedor do clube sorrindo de alegria e orgulho? (**)
Tô com pena da Netshoes, que em pleno momento de turbilhão, iniciou com pompa e circunstância o pré-lançamento da nosso novo Manto Sagrado (http://www.netshoes.com.br/produto/index_ch.aspx?pc=11638)
Vamos dar uma força, galera. É o que nos resta fazer. Nossa nova parceira, assim como já reforcei em colunas anteriores, merece.
Mas acima de tudo, protestemos. Essa corja que aí está não pode mais continuar. O Flamengo sempre será maior do que alguns canalhas que o dirigem ou entram em campo.
E-mails para a coluna: viniciusflanet@gmail.com
(* - ** - Antes que me critiquem, eu não estou dizendo que não compraria camisas, nem que não me associaria ao clube no atual momento. Minha camisa já está até reservada, bem como eu seria o sócio-torcedor nº 00001 se assim o pudesse. Só quis reforçar a completa e absoluta falta de CLIMA. Ninguém hoje compraria SORRINDO uma camisa do clube, até porque não tem ninguém sorrindo ao usá-la nas ruas, correto?)
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