sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

RESENHA - “Nas Garras do Urubu”

Um inventário oral sobre o Flamengo

Escrever uma resenha sobre uma iniciativa de um amigo é uma tarefa inglória. A isenção sempre vai para as picas - corremos o risco da parcialidade para um lado ou de exagerar nas críticas para forçar uma suposta isenção, como muitos acusam Junior Capacete quando o craque comenta os jogos do Flamengo.

Mas vou correr esse risco. Falo aqui do lançamento de “Nas Garras do Urubu”, do meu caro Arthur Muhlenberg, o mais recente programa na FlaTV (http://www.flatv.com.br/).

A primeira edição, uma entrevista com o vice-presidente de futebol Kleber Leite, foi ao ar há duas semanas e é disponível aos não assinantes. Para isso, basta fazer um cadastro bem simples.

O primeiro lote de quatro programas foi gravado com bastante antecedência, em função de uma viagem do apresentador. Isso prejudica a atualidade do programa, já que eles foram gravados bem antes do desfecho do campeonato brasileiro, quando ainda havia uma expectativa de vaga na Libertadores. Isso, claro, compromete o interesse pelo resultado do papo com o segundo convidado, o presidente Marcio Braga.

O cenário do talk-show é simples: Arthur de um lado, o entrevistado do outro, separados por uma mesa em que de destacam uma bandeirinha e um urubu. São quatro blocos, cada um com pouco mais de 10 minutos de papo, e para quem é hiperativo no computador, é plenamente possível ouvir o papo como se fosse um programa de rádio. Mas é importante manter a atenção. Apesar da informalidade, “Nas Garras do Urubu” tem sua relevância ao trazer para o torcedor a palavra de personalidades – goste-se ou não delas –cruciais na condução do futebol do clube.

Logo na apresentação de Kleber Leite, Arthur faz uma pequena provocação: “É o homem que prende e manda soltar dentro do Flamengo”. O dirigente não se faz de rogado e diz que de fato é assim, mas quem tem a chave é o presidente Marcio Braga.

Kleber Leite é uma figura que gera controvérsias. Não são poucos os que atribuem diretamente a ele, ou à mudança de cultura que implantou quando assumiu o clube, primeiro como presidente, depois no comando do futebol, uma grande parte dos problemas estruturais e financeiros por que passa o Flamengo. Os 16 anos sem um dos títulos mais valorizados é debitada no saldo do sujeito que ficaria nacionalmente conhecido por tirar Romário do Barcelona. Seus críticos nunca pouparam o que chamam de megalomania e, particulamente, a falta de títulos no ano do centenário. Por outro lado, tem muita gente que lembra que teria sido a tábua da salvação a entrada de Kleber Leite na reta final do campeonato brasileiro de 2005. O Flamengo estava com a corda no pescoço e ele teve um papel importante para que o clube escapasse de um rebaixamento até então considerado inevitável. É a turma que costuma afirmar “ruim com ele, (muito) pior sem ele”.

Esse antagonismo é um desafio para um entrevistador. Sobretudo para quem é bom de conversa, mas não tem as manhas do jornalismo. Em alguns momentos, Arthur joga as cascas de bananas, como ele mesmo diz. Mas talvez pudesse ser mais incisivo na réplica em determinadas questões, quando o entrevistado dá a deixa para aprofundar assuntos ainda não muito claros para o torcedor. Aliás, nas palavras do próprio dirigente, o torcedor tem mesmo o papel de manter uma permanente “insatisfação, de querer sempre mais”.

Arthur poderia, quem sabe, estudar a possibilidade de chamar um colega - jornalista ou não - que poderia ter o papel das perguntas incômodas. Ainda assim, Kleber Leite fala sobre quase tudo, inclusive sobre temas espinhosos: dos critérios que norteiam as vendas de jogadores oriundos das divisões de base à política de contratações para 2009. E, veladamente, deixa escapar uma crítica ao então treinador Caio Junior quando comenta sobre a escalação improvisada de Sambueza na posição de Juan. Entre as tantas frases interessantes, uma que merece atenção: “A nossa (barca no final de temporada) não será muito grande - será um bote salva-vidas. Faremos contratações cirúrgicas”.

Arthur, ressalve-se, não é jornalista, e não tem o peso profissional desse compromisso com a imparcialidade. Ele é publicitário, um dos bons na sua área de atuação. E ficou conhecido por ser um torcedor que tem (e forma) opinião. Ele não se omite. A cada assunto, mostra sua posição. De todo modo, embora seja veiculado na tv oficial do clube, o programa está a mil léguas da babação de ovo e do culto à personalidade. Aos poucos, o apresentador vai puxando assuntos oportunos, raros no picadinho diário da imprensa, que geram respostas interessantes. Cabe ao webespectador ver e ouvir com atenção, avaliar, guardar as declarações e filtrar aquilo que lhe parece importante.

Ainda não está claro o perfil do programa para o futuro – se ele vai se deter somente em gente que trabalha para o clube ou, mais provável, também reunir personalidades e artistas com identidade rubro-negra.

De um jeito ou de outro, “Nas Garras do Urubu” é muitíssimo bem-vindo. Sua maior contribuição, a meu ver, é a de criar um inventário essencial, praticamente inexistente, para que se possa compreender um pouco melhor o Flamengo de antes, agora e amanhã. Sempre pelo que foi dito – ou não dito – pelos convidados.

Flamengo Net

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