quarta-feira, 9 de julho de 2008

Cobertor curto


Futebol custa. É negócio. É para quem pode. Se o Flamengo tem um dos times mais competitivos do país nos últimos 10 meses, não é por acaso. Teve um preço trazer Ibson e Fabio Luciano, apostar na recuperação de Kleberson, manter os dois melhores laterais em atividade no país, impedir a saída de um dos melhores goleiros do Brasil, investir num centroavante artilheiro do Brasileiro 2006 (ainda que este não tenha correspondido às expectativas). Tudo isso custa. Essa é a razão pela qual o Flamengo é bicampeão carioca, vem de uma sequência de duas participações consecutivas em Libertadores, coisa que não ocorria desde a Era Zico, e figura como um dos reais candidatos ao campeonato brasileiro deste ano.

Tudo isso custa dinheiro. Dinheiro que o Flamengo não tem ou mal tem. Uma das características de Kleber Leite como dirigente - e isso não é necessariamente um elogio - sempre foi apostar num Flamengo grande, acima da mediocridade. Tudo isso tem um preço. Ele montou um time em condições de brigar pela Libertadores, que no final das contas não veio. Duas bolas de Cabañas desviaram na defesa, Ochoa defendeu uma bola improvável, mais uma meia dúzia de fatos correlatos, e o Flamengo saiu prematuramente da competição. As estimativas de prejuízo (ou de dinheiro que o time deixou de ganhar) chegaram a R$ 20 milhões - vide matéria de O Globo. Estava na cara que, mais cedo ou mais tarde, essa conta teria que ser paga.

Por isso, não deveria causar escândalo a negociação de Renato Augusto. Não sei por quanto saiu, e nem estou aqui para defender a diretoria. Mas é bom deixar as coisas claras. Não há no Brasil qualquer clube em condições de passar ileso aos Euros - ou petrodólares - que aqui desembarcam, em pleno feirão internacional da bola. O modelo de negócios do futebol, não só o brasileiro, passa pela venda de jogadores. É triste, mas verdadeiro. E, a julgar pelos valores aventados, não foi um dos piores negócios. No ano passado, Carlos Eduardo saiu do Grêmio para o mesmo futebol alemão por 8 milhões de euros. Sendo que o jovem atacante ajudara seu clube a chegar à vitrine de uma final de Libertadores - coisa que, por uma certa falta de sorte, Renato Augusto não conseguira nem conseguiria neste ano.
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Renato Augusto até que durou muito no Flamengo. O fato de ter brilhado na final da Copa do Brasil, ainda em julho de 2006, já o colocava como um nome certo para a janela do ano passado. Talvez pelas atuações apagadas no Mundial Sub-20, o jogador acabou ficando. Mas, curiosamente, o único alento para quem gostaria de vê-lo mais tempo na Gávea era justamente sua falta de sequência, causada por contusões até mesmo absurdas como a do princípio deste ano. Era evidente que um jogador com suas características - meia-atacante, forte, técnico e com grande potencial por lapidar - logo despertaria a cobiça européia..

Ao contrário de muitos, não vejo a lacuna do ex-camisa 10 como desastrosa para as pretensões no restante da competição. Será importante contratar mais um nome para a posição, mas já vi Kleberson jogar - e bem - como camisa 10 no Atlético Paranaense. É uma das opções de Caio Junior..

No mais, é nosso papel discutir que modelo de negócios queremos para o Flamengo. Futebol é caro e o clube, com dívidas quase que impagáveis, precisa desesperadamente de receitas e de sustentabilidade. Temos que fugir do cobertor curto. Não é possível que o clube tenha que vender jogadores tão prematuramente, como no caso de Pedro Beda, que nem jogou nos profissionais, somente para pagar salário atrasado. Além do mais, se a negociação de valores parece ser inevitável, temos que ter mais paciência com as chamadas pratas da casa, abrindo espaço para que eles joguem, apareçam e se valorizem. Investir em estrutura, num CT que gere novas promessas, é essencial. E, vale dizer, o "compra que a Nação paga" só existe quando se oferece um bom produto e um serviço eficiente - não adiantar achar que por ter 35 milhões de torcedores, qualquer idéia cola: o povão dá valor ao dinheiro que ganha e, nesse caso, os concorrentes não são os outros clubes, mas a indústria do entretenimento como um todo. Ou, então, quem sabe, ficar esperando por um Abrahmovich ou Berlusconi, com todos os riscos embutidos desse tipo de mecenato volátil.
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Enquanto a fórmula mágica não vem, é imperativo, urgente mesmo, que clube monte um atraente plano de sócio-torcedor, a exemplo do que fazem outros clubes, principalmente do sul do país. Embora haja possível conflito de interesses existentes entre patrocinadores de Flamengo e Fluminense, com quem a Suderj também mantém convênio, tudo pode ser resolvido com diálogo e criatividade. O Maracanã precisa ser mais bem explorado comercialmente - com vantagens para os clubes usuários e, claro, também para os contribuintes do Estado. Nessas horas, a rivalidade tem que passar ao largo em nome de um bem comum: a sobrevivência.

Flamengo Net

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