terça-feira, 22 de maio de 2012

Alfarrábios do Melo


Saudações flamengas a todos,

Enfim começou o Brasileiro. De forma chocha, com velhos problemas recrudescendo. Um desses problemas, novamente uma demonstração cristalina da incapacidade de Ronaldinho Gaúcho se motivar a jogar futebol a um nível que transceda tibiamente a caricatura de seu talento. Quem frequenta esse espaço já sabe que isso em nada me surpreende.

De qualquer forma, mais uma vez o nosso morcego andou se estranhando com Painho, o que suscitou várias reportagens e comentários já especulando uma possível saída do sujeito, que, segundo alguns, talvez seria até mesmo a principal solução para os problemas do time.

Sem querer entrar nesse mérito aqui no texto, essa perspectiva de rescisão contratual me fez relembrar como o Flamengo tratou a saída de alguns dos principais jogadores de sua história. Alguns finais são felizes, outros nem tanto. Boa leitura.

LEÔNIDAS DA SILVA
Um dos maiores ídolos da história do Flamengo chegou ao clube em 1936, após passagens por Vasco, Botafogo e Peñarol, além do Bonsucesso, onde iniciou a carreira (e chegou à Seleção Brasileira). Marrento e muito encrenqueiro, acumulou gols, idolatria e muitas confusões por onde passou, e evidentemente no Flamengo conseguiu amplificar todos esses atributos. Principal responsável pelo histórico título de 1939, onde o Flamengo quebrou o maior jejum de sua história (12 anos), Leônidas ajudou a fazer da sua já numerosa torcida uma Nação. Tratado como estrela, sabia de sua condição diferenciada, e a utilizava para negociar contratos e participações em amistosos. Quando os termos da sua remuneração não lhe pareciam adequados, sempre surgia uma conveniente contusão para prolongar a negociação. Mas, com o tempo, as idissincrasias de Leônidas começaram a cansar a torcida e, principalmente, os dirigentes, especialmente após a perda do campeonato de 1940. Já no início de 1941, Leônidas sofreu séria contusão no joelho e foi obrigado assim mesmo a atuar em um amistoso (no qual andou em campo e o time levou de sete). Mesmo com a comprovação da gravidade da lesão, a diretoria cansou de seu comportamento e o negociou apressadamente com o São Paulo, numa transação extremamente rumorosa e que causou revolta entre os torcedores (notadamente Ari Barroso). O Diamante Negro foi ídolo no clube paulista, mas o Flamengo, mais apaziguado e unido, partiu para seu primeiro tricampeonato.

DOMINGOS DA GUIA
Um dos maiores zagueiros (talvez o maior) da história do futebol brasileiro rapidamente se apaixonou pelo Flamengo quando chegou em 1936. Futebol clássico, refinado, quase incompatível para a função que igualmente exercia com rara maestria, Domingos conseguiu a proeza de ser campeão na Argentina, no Uruguai e no Brasil. Pelo Flamengo, foi protagonista nas conquistas de 1939, 1942 e 1943. Era o maior ídolo de um time estelar (um dos melhores da história flamenga), quando uma proposta milionária do Corinthians fez com que o Flamengo o negociasse. Os altos valores e a já avançada idade de Domingos amenizaram a dor da perda, ainda assim muito forte. No Corinthians foi ídolo, mesmo sem conseguir repetir a passagem gloriosa pelo rubro-negro. E no Flamengo, sua ausência foi sentida demais, sendo um dos fatores para que a conquista do tricampeonato em 1944 fosse ainda mais sofrida e árdua.

JAIR DA ROSA PINTO
Integrante do famoso Expresso da Vitória vascaíno, Jair desentendeu-se com a diretoria cruzmaltina e em 1947 se transferiu para o Flamengo, onde teve passagem breve, mas marcante. Em um período pobre em conquistas, destacou-se com seu futebol leve e seu chute venenoso (especialmente exibido no célebre amistoso em que o Flamengo derrotou o Arsenal por 3-1). Entretanto, em um clássico com o Vasco em 1949 o rubro-negro vencia por 2-0, e Jair recebeu um lançamento limpo, mas, sozinho diante do goleiro adversário, perdeu um gol inacreditável. O lance revigorou o adversário, que se motivou para buscar a virada e a goleada (2-5). Revoltada, a torcida passou a queimar camisas no estádio, no que se tornou célebre como “o jogo das camisas queimadas”. Após o jogo, espalhou-se a lenda de que Jair teria atuado de corpo mole. Sem clima para continuar no clube, Jair foi negociado em termos apressados com o Palmeiras, onde foi multicampeão e ídolo. Ainda teria passagem vitoriosa também pelo Santos. E o Flamengo, ainda mais carente de craques, demoraria um pouco para montar um time competitivo.

ZIZINHO
O maior craque flamengo antes do surgimento de Zico foi negociado contra a vontade, em um episódio triste e lamentável. Os presidentes de Flamengo e Bangu discutiam amenidades, quando o dirigente flamengo comentou algo sobre o fato de nenhum jogador do clube ser inegociável. Esperto, o cartola banguense pressionou, e conseguiu arrancar um compromisso de venda de Zizinho. Dessa forma, o maior ídolo da época, o melhor jogador brasileiro em atividade, aquele que se tornaria o craque da Copa do Mundo de 1950 acabava de sair do seu clube de coração, indo jogar no modesto Bangu, onde se destacou a ponto de ter sua convocação para o Mundial de 1954 pedida por muitos (era o melhor jogador brasileiro na época). Sintomática foi sua primeira exibição contra o ex-clube, onde, em uma das maiores atuações individuais da história do Maracanã, quase fez nevar na goleada de 6-0, um crime passional contra seu time de um coração apunhalado e sangrado. Zizinho encerraria a carreira no São Paulo, onde igualmente brilhou. E o Flamengo seguiria por mais anos delicados.

DIDA
Tricampeão carioca, campeão do Rio-SP, campeão de vários torneios internacionais, o maior artilheiro flamengo antes de Zico construiu larga e sólida passagem pelo rubro-negro. Em 1963, já às vésperas de completar 30 anos, desentendeu-se com o treinador Flávio Costa e foi negociado com a Portuguesa, já durante o Carioca. No clube paulista, conseguiu a impressionante marca de 54 gols em uma temporada, mostrando que ainda reunia plenas condições de atuar em alto nível. O Flamengo, mesmo sem o craque, conseguiu conquistar o Carioca daquele ano, em uma partida histórica contra o Fluminense.

ZICO
O maior, melhor, mais vitorioso, mais idolatrado, principal artilheiro e referência do Flamengo foi negociado em 1983, logo após a conquista do tricampeonato brasileiro (a transação já estava amarrada antes). O rubro-negro não queria perder a oportunidade de auferir lucro com sua saída (dali a dois anos Zico receberia passe livre) e não dificultou o assédio da Udinese. Consumada a saída, a Gávea viveu dias de fúria, choro e catarse coletiva poucas vezes possível conceber em uma organização esportiva. O efeito foi tão contundente que o time esfarelou-se, passando a perder jogos tolos, a ser goleado por rivais muito mais fracos, a atuar em um Maracanã às moscas. Nem a renúncia do presidente que ancorou a negociação foi suficiente para aplacar a fúria e a histeria coletiva. Zico teria boa passagem pelo clube italiano, atrapalhada pela fragilidade da equipe. O Flamengo somente retomaria o caminho dos títulos e das conquistas após o retorno do Galinho, em 1985.

ROMÁRIO
O marrento baixinho foi contratado em uma negociação polêmica em rumorosa, em 1995. Subvertendo toda e qualquer noção de hierarquia, passou a fazer da Gávea sua residência, e quem se punha em seu caminho era implacavelmente expelido, de jogadores a dirigentes. Não por acaso, a “Era Romário” foi opaca em títulos, e em 1999, farta dos excessos do jogador, a diretoria resolveu adotar uma “solução final”, demitindo-o estabanadamente após mais uma farra. Romário foi reforçar os rivais, onde trilhou trajetória vitoriosa. O Flamengo, já imerso em uma administração caótica, preparava-se para viver o pior período de sua história.

Uma boa semana a todos.

Flamengo Net

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