terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Carta Aberta ao Flamengo

(até porque nada no Flamengo é confidencial)

Recebi este e-mail ontem. Pela ética que existe - pelo menos aqui isso existe - esperei pela resposta do Luiz para publicar o texto. Não foi surpresa lê-lo no Urublog. Um real tratado sobre a atual - e triste - condição do clube. Mais uma vez, agradeço ao Moraes por me linkar com o autor.

Luiz Hélio Alves*


"O Clube de Regatas do Flamengo vive a era do culto ao caos. Nessa espécie de torre de Babel do esporte nacional, ninguém se entende e o que se vê é uma insana briga praticada por uma escrota política do quanto pior estiver melhor ficará. Para quem? Resposta rápida e fácil: para ninguém. Ao contrário do que pensam esses jênios (com J mesmo) que acreditam estar prestando relevantes serviços ao clube expondo-o a um escarcéu sem fim, tudo isso não passa de uma ação suicida à qual atingirá, de forma definitiva, a todos. Gregos e troianos, rubros e negros, situação e oposição, nada e nem ninguém no CRF escapará ileso do efeito devastador dessa ignóbil forma de disputa de poder que sempre existiu, mas que agora atinge o ápice da sua burrice e intolerância.


Se um dia o Governo, mediante o Ministério Público Federal, resolver fazer uma operação pente-fino no futebol brasileiro, problemas financeiros e outros itens mais escabrosos certamente serão encontrados em todos os clubes e entidades. Eu disse em todos, inclusive naqueles que atualmente posam como exemplos de gestão ilibada e profissional. Mas por que então só vemos esse furdunço todo no Flamengo? Por que só o Flamengo tem o seu clamoroso estado de insolvência escancarado, dia após dia, por toda a imprensa? Por que enquanto os demais clubes (e aqui se excetua apenas o "co-irmão" Vasco da Gama por razões evidentes) procuram tratar as próprias mazelas no anonimato das suas "enfermarias internas", o Flamengo tem as feridas expostas a tantas porradas dos agentes infectantes e que por isso mesmo vive a sangrar constantemente, não sarando nunca? Estão querendo o quê? Que gangrene de vez e se torne realmente incurável? Outro dia, numa entrevista para o programa "Nas Garras do Urubu", da Fla TV, o renomado especialista em marketing esportivo e agora coordenador do Projeto Fla Olímpico, João Henrique Areias, ressaltou achar um absurdo a forma como o Flamengo cuida da sua própria imagem e, pior ainda, de que maneira são tratados os parceiros, empresas que injetam dinheiro no clube.


Por todo o acima exposto, só resta perguntar: afinal, quem são os famosos e malfadados X9, dedos de seta, cabuetas da Gávea ou que por lá rondam? Sim, pois essa cabuetagem toda deve passar longe da assessoria de imprensa, visto que esta por várias vezes é pega de surpresa com as "bombas" estouradas quase diariamente nos veículos de comunicação. Com que propósito, por exemplo, se concede a um jornalista ter acesso exclusivo a documentos sigilosos e de responsabilidade restrita aos membros do Conselho Fiscal? Ou ainda, como pode uma reunião entre comissão técnica, diretoria e atletas, que deveria ter o seu teor resguardado, simplesmente ser dedurada na maior cara de pau como se fosse a coisa mais comum do mundo? O depoimento do capitão Fábio Luciano sintetiza bem o quanto é difícil para um profissional trabalhar no rubro-negro: "Tivemos uma conversa que vazou por uma pessoa que de repente queria criar um clima ruim, mas não teve insatisfação nenhuma na concentração. Nos alegramos porque os salários dos funcionários foram pagos para pessoas que precisam mais". Precisa dizer mais alguma coisa? O fato é que tem neguinho querendo ver o mar pegar fogo para os peixinhos saírem voando.


Camaradas, lugar de repórter é na beira do gramado ou na sala de imprensa durante as coletivas após as atividades do dia e para tratar de assuntos referentes ao futebol. A resposta tinha que ser curta e grossa a um pentelho insistente: amigo, seu jornal, sua rádio ou sua tevê nos doarão dinheiro? Não? Então passe bem! Não se trata de encobrir a verdade e nem de querer passar uma falsa realidade para o sócio, torcedor e público em geral. Problemas todos já sabem existir, só não precisa é expor as coisas de forma tão irresponsável quando muitos assuntos deveriam ser resolvidos (ou ao menos tentado) internamente por quem realmente pode interferir e agir diretamente. Se a questão é querer atingir quem está no poder, é preciso tomar cuidado para o feitiço não virar contra o feiticeiro no caso de haver mudança de grupo no próximo pleito. Na verdade, o que sai arranhada não é a imagem de dirigente A ou B, mas a do próprio Flamengo, maior prejudicado de toda essa esculhambação. E imagem positiva demora a ser recuperada. Vide o Vasco. Seria utopia todas as correntes adversárias esquecerem as picuinhas pessoais e tratarem de formar uma frente realmente ampla e com participação de todos que dizem amar o Flamengo? Não é estranho tanta guerra para gerenciar uma casa quebrada e toda bagunçada? Por que não se faz primeiro um mutirão para arrumá-la, colocá-la em ordem e aí sim, em novembro, voltarem a se estapear eleitoralmente? Sinceramente, é complicado achar que a solução só esteja fora da Gávea como muitos dizem. Tem muita gente boa e decente desejando presidir o Flamengo, mas... "não agora, só quando tudo estiver sanado, com todos os problemas resolvidos". Assim cara pálida, todo mundo quer! Está disposto a ajudar? O momento é esse. E a questão não deve ser tão maniqueísta assim, entre mudar ou não mudar, já que mudança sempre gera esperança e expectativa de melhoria, algo bastante salutar para o fortalecimento democrático da instituição. O problema é sob que aspectos - e a que preço - essa mudança está sendo orquestrada. Será que para se apresentar uma nova proposta de modelo de gestão é preciso trucidar o clube atingindo-o com todo esse fogo muy amigo?


Quanto à piada de mau gosto que foi o jogo do último sábado, o time é o menor dos nossos problemas. Até porque é muito simples resolver isso colocando jogador no banco, dispensando um ou outro que não está rendendo o esperado e até, em último caso, trocar de técnico. Numa hora qualquer as coisas começam a engrenar. O problema é exigir excelência dentro de campo quando fora dele tudo está a mais completa zorra. Analisemos essa cena. Um jogador do Flamengo está no seu quarto durante a concentração para uma partida decisiva de uma semifinal, então começa a ler num famoso e polêmico jornal esportivo uma matéria com depoimento de um conselheiro do clube: "...Houve um terremoto no fundo do mar e as ondas ainda não chegaram à praia onde a turma do futebol e outros setores tomam sol. Vem aí um Tsunami!". Estimulante, não?! Com certeza não faltaram vontade e nem comprometimento, mas será que a cabeça funcionou legal diante de uma situação dessas? O cara imagina que já está sem receber três meses de salários e ainda fica sabendo (pela imprensa, claro) que o bicho vai ficar ainda mais feio. Para explicar melhor esse assunto só mesmo o Dr. Paulo Ribeiro. Fica evidente, pois, que jogadores e técnico têm o mínimo de culpa nesse mais novo vexame. Transformar um time derrotado em vencedor da noite para o dia é até fácil, infelizmente não podemos dizer o mesmo em relação à turbulenta política praticada dentro do clube.


"Continuo ser Flamengo, ser Flamengo é que dá pé. No balanço da moçada, pro inferno quem quiser. Se ganha o Flamengo eu fico contente e compro foguetes para festejar. Se perde o Flamengo o que é que vou fazer? Não queimo a bandeira, não rasgo a carteira porque sei perder. Continuo ser Flamengo...".

(Autor: quem souber favor me informar - Intérprete: Hélio Nascimento). "


*Luiz Hélio é Flamengo, poeta e jornalista.

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