quinta-feira, 9 de novembro de 2006

Surgiu aqui no blog alguns posts atrás uma discussão bastante interessante, com vários pontos de vista diferentes, sobre a fórmula de disputa do Campeonato Brasileiro. Agora que já não temos mais muito o que almejar nesse campeonato (além de uma posição digna na tabela) me pareceu um bom momento para postar a minha opinião, com o objetivo principal de suscitar e alimentar o debate sobre o tema....


Pontos Corridos....

Há poucos anos atrás surgiu no futebol brasileiro um movimento, vitorioso, diga-se de passagem, em prol dos pontos corridos. Movimento este em grande parte defendido pela imprensa paulista e pelo São Paulo, principalmente. Os partidários dessa tese tinham como modelo os campeonatos europeus, e enalteciam principalmente a organização e os vultosos lucros por lá obtidos com esse sistema. Advogavam que somente assim, com um campeonato com datas pré estabelecidas, podia-se chegar a uma organização mais definitiva para o campeonato brasileiro, o que de quebra conferiria ao mesmo mais credibilidade e mais critério.
Todos os argumentos citados acima têm o seu valor e a sua razão. Todos somos favoráveis a regras e critérios que não mudem de ano pra ano. Todos somos favoráveis a termos (como efetivamente temos tido nos últimos anos, é bom ressaltar) um calendário pré estabelecido e imutável (salvo raras e justificadas exceções).Todos entendemos que uma vez estabelecidas e assimiladas essas regras, e esse calendários, o futebol brasileiro tenderia a se viabilizar via contratos de publicidade e televisão. Enfim, todos somos favoráveis a um campeonato brasileiro forte, rentável e justo.
Tudo isso é verdade. Só não entendo a lógica, que aliás foi habilmente trabalhada na época, de só se conseguir essa organização, esse calendário, esses eventuais lucros, com a fórmula dos pontos corridos. Senão vejamos: alguém conhece campeonato de maior sucesso empresarial e comercial que a NBA (disputada na sua fase final através dos play-offs, espécie de mata-mata, apenas com mais jogos entre cada dupla de adversários)? Ou mesmo a Copa do Mundo?
Há outro argumento utilizado pelos defensores dos pontos corridos: a justiça. Argumentam que nada mais justo que um time que obteve mais pontos no confronto direto com todos os seus adversários ser sagrado campeão. Argumento esse que a primeira vista parece bastante válido. No entanto, se examinado com mais detalhe, na minha opinião, também não resiste. Tomemos como exemplo o Campeonato Brasileiro de 2002. (Poderia citar o de 92, mas aí vão me acusar de só pensar no Flamengo e tal....) Naquele ano o São Paulo se classificou para a 2ª fase em primeiro lugar absoluto, incontestável, com uma regularidade muito parecida com a que vem desempenhando nesse ano de 2006. Já era dado como favoritíssimo ao título pela quase totalidade da imprensa ao término da 1ª fase (aliás, a gente conhece bem essa história de favoritismo, vide o campeonato brasileiro de 92, as finais cariocas de 99, 2001...). Já o Santos de Robinho, Diego, Elano e cia. limitada, um belíssimo time, diga-se de passagem, fez uma campanha mais irregular na 1ª fase, só se classificando para o restante do campeonato nas últimas rodadas e mesmo assim, só obtendo a 8ª e última vaga, tendo portanto que enfrentar logo em seguida o 'poderoso' São Paulo, e tendo contra si a desvantagem de dois resultados iguais e ainda o segundo jogo que seria disputado no campo do adversário. Tudo muito justo, graças a campanha prévia superior do seu adversário. Só que aí, nesse momento, o futebol mais uma vez mostrou porque é o mais maravilhoso e imprevisível dos esportes. O time do Santos cresceu no momento certo, e provou por A + B, de maneira incontestável, que efetivamente era mais time que o São Paulo, sapecando-lhe um 3 a 1 e um 2 a 1, nos dois jogos que definiriam quem iria adiante. Aliás, alguém hoje tem alguma dúvida que aquele time do Santos era mesmo bem melhor que aquele time do São Paulo? O Santos seguiu sua bela campanha até sagrar-se campeão brasileiro de 2002 com toda justiça e todos os méritos, num campeonato emocionante, que atraiu a atenção de todos aqueles que gostam de futebol (mesmo aqueles cujos times não conseguiram se classificar para a 2ª fase).
Pergunto eu: imaginem que o campeonato fosse de pontos corridos e o São Paulo seguisse com uma larga vantagem frente ao Santos quando esses 2 times se enfrentassem num eventual 2º turno: será que o Santos jogaria com a mesma empolgação, dando tudo de si, tal como fez em 2002 naqueles 2 jogos decisivos? Será que hoje quando o São Paulo, no atual campeonato, joga com um time que está no meio da tabela, ambos jogam com a mesma vontade, a mesma disposiçaõ, a mesma pressão? Será que efetivamente está se medindo quem é o melhor, ou simplesmente quem é o mais regular, quem tem mais estrutura e além disso quem tem mais interesse no jogo em questão?
Futebol, pra mim, não se trata disso. Futebol trata de vitória, de enfrentamento direto, de 'ganhar quando tem que ganhar', por quantos gols tiver que ganhar. E não colecionando pontos ao longo de um campeonato longo, sem atrativos. Mede-se quem é o melhor em confrontos diretos, um enfrentando o outro frente a frente, mesmo que uma vantagem seja conferida a um dos dois (obtida merecidamente por uma campanha anterior melhor, por exemplo). São esses jogos que atraem o público, e que fazem do futebol o que ele é. E isso não vale só para o futebol ou para o campeonato brasileiro, apesar de o futebol potencializar essa emoção e ter se tornado o esporte mais popular do mundo também por causa disso. Poderia citar os play-offs da NBA, incluindo os jogos finais, o SuperBowl (a grande final do futebol americano, considerado por eles (coitados, não cohecem uma final de campeonato Carioca entre Flamengo e Vasco) o maior evento esportivo do planeta), a final da Copa do Mundo, e tantos outros.... Só para exemplificar, quem de nós não se lembra do gol de Nunes contra o Atlético em 80, do Leão estirado em pleno Olímpico em 82, do massacre contra o Santos em 83, daquele chocolate contra o Botafogo em 92, das batalhas da Libertadores contra o Cobreloa, do passeio contra o Liverpool em 81, do gol do Rodrigo Mendes, do mágico gol do Pet ? ..... só pra citar alguns. Todos jogos decisivos! Todos jogos onde era matar ou morrer, onde a emoção dos acontecimentos eternizou 'para sempre' (permitam-me a redundância) aqueles momentos na memória dos felizardos que tiveram a sorte de estar presentes nesses eventos únicos. E só mencionei jogos finais aqui. Me abstive de citar semi-finais ou mesmo quartas de final de igual emoção (aquele 3 a 2 de 87 contra o Atlético MG lá no Mineirão, por exemplo...).
O que será que um são paulino terá para contar no futuro para um filho seu à respeito desse xôxo campeonato de 2006? 'Olha meu filho, fizemos uma campanha muito consistente, muito regular....' ??? Será que não seria muito mais bacana (e até mais justo!) assistirmos a uma final entre São Paulo e Inter e aí sim, afirmarmos quem é o melhor?
Copiamos sem pensar uma fórmula utilizada na Europa, mas que claramente não vem dando os frutos imaginados e que visivelmente não combina com a nossa cultura. Digo e repito: se os espanhóis tivessem a felicidade de assistir pelo menos uma vez a jogos finais entre Real Madri e Barcelona nos moldes do antigo campeonato brasileiro, com um jogo no Nou Camp, outro no Santiago Bernabeu, não tenho dúvida que eles é que nos teriam imitado.

Flamengo Net

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