Filosofando no Inferno
O ÊXODO E O "PARREIRISMO"
Acho que duas mudanças que ocorreram no futebol a partir de 82 mais ou menos são peças chave para entendermos a situação atual do Flamengo:
(1) A derrota do Brasil em 82 fez com que o futebol se tornasse o paraíso dos retranqueiros. E tome cabeça-de-área. Evoluímos rapidamente de um 4-3-3 para o 4-4-2, e quase para um 4-5-1 (ou 5-4-1).
(2) O êxodo de jogadores para a Europa, inicialmente para a Itália, e depois para quase todos os países. Um processo que esconde misteriosos esquemas ocultos (quando houve a Operação Mãos Limpas, o futebol italiano murchou, cedendo espaço ao espanhol). Com isso, os grandes times do Brasil, que eram os pólos de atração dos grandes jogadores de todas as partes do país, passaram a ver seus times sistematicamente desmanchados. Com times que duram tão pouco, o entrosamento fica prejudicado, e os jogadores não conseguem se tornar ídolos, aumentando a instabilidade emocional. Tanto é verdade que na últimas décadas vimos não só o Flamengo entrar em decadência, todos os grandes times têm tomado um número maior de goleadas. E ao mesmo tempo, vemos times que outrora viviam no sobe-desce, como Atlético-PR, Juventude, Goiás e Ponte Preta, se firmarem nas primeiras posições.
Por que o Flamengo foi um dos mais afetados por este processo?
Primeiro, o Flamengo não consegue se dar bem com técnicos retranqueiros, estilo Parreira-Ricardo Gomes-Joel Santana. Precisamos de técnicos que habituem o time a gostar de atacar. Estes técnicos funcionam no Juventude, no Bragantino, e no Fluminense e Botafogo, mas no Fla não.
Segundo, o Flamengo foi mortalmente atingido pelo êxodo. Desmontamos sucessivas gerações de grandes revelações na década de 80, e o equilíbrio financeiro do clube desabou, seja porque a escalada galopante dos salários tornou impossível viver das rendas de jogos, seja porque a enxurrada de dinheiro cada vez mais envolvida no futebol corrompeu dirigentes, atraindo empresários picaretas. Com o desmonte dos clubes, os empresários (que antes eram apenas assessores jurídicos dos jogadores) se tornaram cada vez mais milionários, e controlando atletas cada vez mais jovens.
O NIVELAMENTO PELO DESEQUILÍBRIO
Volta e meia se fala que o campeonato é cada vez nivelado. Concordo. Mas não porque é um campeonato equilibrado, e sim um campeonato desequilibrado. Se fosse equilibrado, todos os jogos seriam empates ou vitórias magras. Mas não, o que vemos é boa parte dos times, inclusive os que lideram, tomando sonoras goleadas.
Num cenário de nivelamento, o fator sorte/azar passa a ser decisivo em muitas partidas. No campeonato atual há exemplos flagrantes: Coritiba 0x1 Vasco, Palmeiras 2x2 Vasco, Corinthians 2x2 Botafogo, por exemplo. Jogos em que os times da casa simplesmente dominaram toda partida, e poderiam ter ganho com facilidade (no caso do Botafogo, poderia ser até uma goleada), mas acabaram perdendo o jogo ou cedendo o empate graças a lances isolados. Outro exemplo, a surpreendente decolada do Corinthians, que estava atrás do Flamengo, e que subiu na tabela graças a uma seqüência de vitórias mirradas de 1x0.
Se o fator sorte pesa, aí nós nos complicamos, porque o Flamengo nunca primou pelo excesso de sorte.
Vejam as escalações de Flamengo e Ponte Preta. A Ponte tem 16 pontos a mais que nós. Sejam honestos: o nosso time é tão pior assim? Qual é a mágica? Tudo bem, vocês vão dizer "na Ponte a pressão é menor!". Sim, mas eu poderia usar como exemplo a escalação do Corinthians, que está 19 pontos a nossa frente, e também tem um elenco modesto.
Ponte Preta Flamengo
Lauro x Júlio César
André Cunha x China
Luís Carlos x Júnior Baiano
Rafael Santos x André Bahia
Luciano Baiano x Athirson
Ricardo Conceição x Da Silva
Marcus Vinícius x Junior
Flávio x Íbson
Júlio César x Zinho
Alecsandro x Dimba
Anselmo x Felipe
COMENTARISTAS DE ARAQUE
O que mais vemos na imprensa são comentários condicionados ao resultado. O time vai jogar fora, monta uma retranca e espera apenas pelo empate. Vamos supor dois jogos idênticos em tudo. Num ele consegue se segurar e faz um golzinho de falta, daqueles em que a bola é mal chutada desvia na barreira e mata o goleiro. No outro, ocorre o oposto, o time acaba tomando o gol.
Os jogos foram idênticos. Como serão as análises? Idênticas? Nada disso. Na vitória, os analistas dirão que o time "resistiu na raça e trouxe uma vitória heróica". No segundo, vão dizer que o time "jogou encolhido pensando no empate, e não resistiu à pressão".
Num cenário assim dominam as análises simplistas: o Criciúma, que era "um modelo de competência e organização" quando liderou o campeonato, hoje está beirando a zona do rebaixamento.
Para dizer que o Flamengo é apenas uma vítima inocente das circunstâncias, chego agora à incompetência dos dirigentes. O Fla a cada ano vem tendo campanhas piores, com mais derrotas, com mais goleadas, mais vexames. Bem, tivemos os mais diversos jogadores e treinadores, a única coisa que se manteve mais ou menos é a estrutura do clube. Como não conheço os bastidores subterrâneos da Gávea, só cabe a mim perguntar:
Por que contratamos jogadores ruins?
Por que os bons jogadores contratados não se encaixam no time?
Por que as divisões de base não revelam mais grandes jogadores?
Por que formamos laterais que não sabem cruzar?
Por que formamos atacantes que não sabem chutar?
Por que não se treina de forma intensiva?
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