terça-feira, 16 de novembro de 2004

Batendo na trave

Deixa eu contar uma história para vocês. É uma história real, eu lhes garanto isso.

Era uma vez, um garoto a quem iremos chamar de X. Ele nunca tinha repetido de ano. No primário, sempre passou com louvor. Nem faltava aula. Era O exemplo. Até que começou o ginásio.

Quando chegou na quinta série, ele passou raspando. Os pais deram pequenos avisos e nada mais. Férias garantidas. Na sexta série ficou de recuperação, em três matérias. Perdeu o verão. Os pais avisaram durante o ano, mas nem eles pressionaram, nem ele se cuidou o suficiente. Passou na recuperação e pensou "perdi o verão, mas passei de ano. Ninguém pode falar nada. Estou invicto".

Dois anos caindo de produção e nem se tocou do problema. Os pais não falaram muito, afinal, ele passou de ano.

Veio a sétima série. Depois de um primeiro bimestre bom, X. caiu muito no segundo. Demais. Um vexame. Os pais foram chamados na escola e todo mundo conversou com ele. "Presta atenção que depois não dá para recuperar. Você ainda tem tempo". X. pensou que tinha mais tempo do que na verdade possuía e deixou de lado. Eram as férias de julho e ele queria aproveitar. No terceiro bimestre, uma tragédia. Aí o tempo encurtou. Faltavam dois meses apenas e o garoto não tinha mais como passar direto, só via recuperação.

Estudou um pouco, fez bons testes e ao fim das primeiras provas do bimestre disse "fiz ótimas provas. Me dei muito bem". As notas foram pavorosas. Os pais não entregavam os pontos, mas já esperavam pelo pior. X. era o único que acreditava que no final passaria, fosse por notas mágicas nas provas finais, fosse por um conselho de classe que o aprovaria, fosse por qualquer ajuda divina que receberia. Não veio nada disso e ele repetiu. Mesmo com seu passado bom e todos os avisos, ele foi reprovado.

"Agora, vai estudar com um monte de crianças. Perdi meu dinheiro. Joguei dinheiro fora" diziam os pais. Mas eles achavam que agora o garoto tinha aprendido a lição. X. aprendeu a lição? Não.

No ano seguinte ele desabou logo no início e não se levantou. Foi porrada atrás de porrada. Repetiu a sétima série pela segunda vez. Os mesmos avisos, os mesmos esporros, as mesmas notas. E ele mudou de escola.

Conseguiu, numa escola bem mais fácil, passar de ano, mas ainda repetiu outras séries. Sempre achou que se salvaria no final. Podem até falar que é burrinho e sei lá o que, mas ele sabe que é capaz. É muito capaz, apenas não se cuidou e ficou pra trás. Bateu na trave várias vezes até que um dia, caiu. Perdeu tempo e dinheiro. Perdeu a confiança dos pais. Perdeu a própria confiança. Hoje está mais seguro, mas precisou lutar muito para levantar. Precisa recuperar o tempo perdido e sempre se lembra de pelo menos um aviso de seu pai:

"Isso vai fazer falta lá na frente".

Pois bem. O Flamengo há anos vem recebendo avisos. O que aconteceu acima, aconteceu com o Fluminense também. Não que vá ocorrer conosco, como bem disse a Carolina, ainda estamos na primeira divisão, mas os avisos são bem claros.

Gente, essa história é real. Não é metáfora com a situação do Flamengo. E levantar uma pessoa, é mais fácil do que levantar um time.

Flamengo Net

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