terça-feira, 15 de maio de 2012

Alfarrábios do Melo

Saudações flamengas a todos.

Vai começar a segunda temporada 2012 para o Flamengo. No próximo final de semana, o rubro-negro inicia sua trajetória no Campeonato Brasileiro, jogando em Recife contra o Sport local. Serão 38 rodadas onde certamente emoções das mais diversas irão aflorar.

Que São Judas Tadeu nos proteja.

Mas hoje quero colocar em discussão outro assunto. Fala-se das dificuldades de se reestruturar o elenco, da falta de dinheiro para a vinda de jogadores, da eterna incapacidade de se conseguir estampar uma marca na camisa, dos nossos dirigentes (sic) batendo cabeça, do nosso treinador montando (?) um elenco (ai, Jesus!), enfim, material que seria farto para o saudoso Stanislaw Ponte Preta montar vários volumes de seus Febeapás.

Mas não é disso que eu quero falar.

Na verdade, a minha dúvida de hoje, como torcedor do Flamengo, é mais simples, menos abrangente, mais prosaica.

O que fazer com Ronaldinho Gaúcho?

O prazo de validade de Ronaldinho Gaúcho no Flamengo está expirando (estou sendo otimista, juro). Um ano e meio após a mais bombástica contratação do futebol brasileiro no século XXI ter se concretizado, eis que a relação entre as partes parece sucumbir diante das inúmeras fissuras que vão surgindo diariamente, em metástase. Colhendo declarações, comentários e impressões aqui e ali, tudo indica que Flamengo e Ronaldinho não rezam o mesmo credo há algum tempo.

Ronaldinho é o mais perfeito e acabado exemplo da ex-estrela em decadência. Atingiu níveis de idolatria jamais dedicadas anteriormente a um futebolista. Superastro, exposição hollywoodiana, multicampeão, tudo repousava sob seus pés. Copa do Mundo, Champions League, Melhor do Mundo Fifa, Santiago Bernabeu explodindo em palmas, reis, chefes de estado, CEO's, megacorporações, todos, absolutamente todos, um dia beijaram-lhe as mãos.

Mas Ronaldinho era jovem. E jovem cansa rápido.

Após 2006, Ronaldinho encheu o saco da carreira. E começou a sua impressionante trajetória descendente. Logo viu ascender outro craque (Messi), e se viu enxotado do Barcelona. Ainda rodou pelo Milan, onde sua saída, após um bom início, também foi bem recebida pelos tifosi rossoneri. E eis que surge o Flamengo.

Rio de Janeiro, o balneário perfeito para o jovem ex-craque que quer viver a vida. Festa todo dia, praia, um sol cinematográfico, uma torcida pronta a lhe dedicar momentos da antiga idolatria, uma cultura, digamos, maleável, enfim, o pacote perfeito para seguir a carreira. Foi só valorizar um pouco a coisa, e após várias gordas rodadas de picanhas e maminhas, eis que o Flamengo vence um leilão de previsível final. Resultado? Salário ainda nos patamares de megaestrela, defasado (pra cima) em pelo menos quatro anos.

Não que a transação fosse, numa primeira análise, de todo ruim para o Flamengo. O monstruoso e irreal salário seria bancado em grande parte por uma empresa parceira, restando ao clube uma fatia bastante viável. O Flamengo teria em seus quadros um grande jogador, uma referência, um sujeito efetivamente capaz de desequilibrar partidas, ainda que bem distante de seus tempos de glória. Mas ainda detentor de um talento indiscutível. E de um nome, uma imagem capazes de render vívidos ganhos com exploração de marca, desde que trabalhada de forma profissional.

E por que deu errado?

Porque Ronaldinho é jovem. E jovem cansa rápido.

Campeão invicto, gol do título da Taça GB, um bom início, que foi se esfumando à medida que nosso herói ia se tornando íntimo das casas noturnas cariocas. Um primeiro sinal de alerta e a rápida reação, com Ronaldinho se tornando o principal jogador flamengo no Brasileiro, comandando o time em uma arrancada que quase valeu a liderança, com direito a uma atuação de gala contra o badalado Santos de Neymar, onde Ronaldinho, talvez pela última vez na carreira, viveu dias de supercraque. Seleção Brasileira, tudo parecia caminhar dentro do esperado.

Mas os atritos com um treinador farto de seus excessos, a patrulha da imprensa e de parte da torcida, e principalmente o desânimo com a rotina de treinamentos novamente entediaram Ronaldinho. Ademais, o monumental salário começou a atrasar. E enfastiado, cansado, entediado de seu brinquedinho rubro-negro, Ronaldinho começou a cair, e cair, e cair. Um último suspiro ainda levou o Flamengo à Pré-Libertadores.

E então o amor acabou. De vez.

Conseguiu, com a ajuda de uma mal-intencionada diretoria, expelir o inconveniente treinador. Fez (não ele, mas o irmão) um estardalhaço com os salários atrasados e conseguiu receber, o que irritou parte do elenco. Aliás, com o elenco a inicial admiração e idolatria rapidamente passou à indiferença e inconformismo. Porque jogador tem uma lógica simples. Ganhou mais, tem que resolver no campo. E quando não resolve no campo, não merece ganhar mais. E Ronaldinho, além de ganhar mais, ainda recebeu seus atrasados ANTES dos outros. Suas festas e baladas atingiram uma frequência que beirou o insuportável. No campo, um futebol de zumbi, de morcego proporcionou a uma incrédula torcida momentos caricatos. Não era possível que aquele poste que se arrastava à beira da linha lateral fosse o maior craque do principal time do país.

Não foi difícil prever os resultados. As derrotas se empilharam, uma mais, outras menos vexaminosas. E Ronaldinho sempre ali, inerte, mudo, omisso em campo e fora dele, numa verdadeira metáfora de sua diretoria, que insiste em mantê-lo mesmo após a debandada da empresa parceira, que vislumbrou ter jogado dinheiro fora com um produto podre, e evadiu-se antes de prejuízos maiores.

E agora?

Ronaldinho é fortemente contestado pela imprensa, que o vê decadente e em fim de carreira, pelo torcedor comum (aquele que não recebe “agrados”), que o vê incapaz de comandar, de jogar futebol em alto nível ou pelo menos de mostrar alguma garra, por parte da diretoria (sim, há momentos de lucidez em alguns diretores), que já reconhece ter feito mau negócio, pelo elenco, que não o reconhece como referência técnica ou de comportamento, e até mesmo pelo bonachão treinador, que não aguenta mais seu desinteresse com as obrigações da profissão.

Então, o que fazer?

Ronaldinho até pode transformar em lixo este e pilhas de outros textos que tem sido escritos comentando o que acontece com o jogador. Pode, tem talento, é fisicamente forte. Mas precisaria querer, traçar metas e planos para sua carreira. Só que o sujeito não quer. Seus horizontes são um tiro curto, brilhar um jogo aqui, outro ali. E curtir a vida, que é curta. Afinal de contas, Ronaldinho é jovem.

O cenário tem, mais ou menos delineados, três possíveis caminhos: a ruptura completa, que seria extremamente danosa ao Flamengo, por uma série de motivos (o clube não paga, descumpre o contrato, o jogador pleiteia rescisão, sai de graça e ainda consegue uma indenização milionária). Outro caminho seria a insistência com o jogador, que provavelmente ocasionaria o aprofundamento de eventuais divergências com outros nomes do elenco (um racha), corroendo ainda mais um já conturbado ambiente de trabalho, com consequências imprevisíveis.

Resta uma alternativa. Reconhecer o fim da relação, buscar o entendimento, a saída consensual, o “hasta la vista”. O Flamengo precisa ter finanças mais equilibradas para viabilizar contratações mais sólidas, o que hoje é inviável com a presença de um peso como Ronaldinho. Por outro lado, a convivência com salários atrasados e a contínua exposição negativa solapam ainda mais a já comprometida imagem do jogador, que tende a se tornar uma figura folclórica, um triste fim para uma das mais fantásticas trajetórias de um esportistas. O divórcio amigável daria a ambos, clube e jogador, perspectivas mais luminosas a curto prazo.

Afinal, Ronaldinho é jovem e está cansado.

O Flamengo também.

Flamengo Net

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